Quando perguntamos sobre as bases que sustentam um grupo de amigos, podemos elencar os seguintes critérios: preferências equivalentes, idade aproximada, afeição mútua, decisão voluntária para ser amigo de alguém, afinal de contas ninguém é amigo por obrigação. Uma família, por sua vez, possui uma realidade distinta: idades diferentes, pois temos avós, pai, mãe, irmãos, tios, primos, preferências na maioria das vezes nem um pouco análogas e por fim, não decidimos quem deve ser nosso parente, eles, como em um passe de mágica simplesmente aparecem.
Ao prestarmos atenção na escolha que Jesus fez dos Doze apóstolos, notamos facilmente que ele formou um barril de pólvora (Mc.3.13-19). Isso porque em seu grupo havia um cobrador de imposto, Mateus (alguém, no mínimo não muito desejado), pescadores (bem provável que prejudicados em sua profissão por pessoas como Mateus), um zelote, que se entende como alguém disposto a agir com violência diante de um exemplo de infidelidade à lei de Moisés. Enfim, ou Jesus tinha o que se chama de dedo podre para escolher pessoas, ou ele queria nos mostrar algo.
O grupo dos Doze tinha tudo para dar errado, com uma única exceção, a presença de Jesus. Não fosse por Jesus eles nunca poderiam pertencer ao mesmo grupo. Sua unidade estava para além de uma roda de amigos, era uma unidade familiar. Eles deveriam se relacionar com pessoas que por sua própria iniciativa nunca iriam conviver. Se Jesus tivesse dado a opção para alguns dos Doze escolher outros integrantes teríamos um grupo de amigos, pois a escolha seria movida por afinidades. Mas como a escolha coube unicamente a Jesus, o critério da afinidade não foi levado em consideração.
A igreja atual é a continuação dessa escolha inicial feita por Jesus, uma escolha que redefiniu o que era ser povo de Deus. Hoje é muito comum segmentarmos a igreja em grupos de crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos. É claro que um trabalho direcionado para cada faixa etária é sadio e surte bons efeitos ao longo do tempo. Contudo, se numa igreja as pessoas se relacionam somente com as mesmas de sua faixa etária, ou que possuem as mesmas preferências, essa comunidade deixou de ser uma família e se tornou uma roda de amigos. Se uma igreja possui uma fé com identidade jovem, ou mesmo adulta, essa não é a fé cristã. O que caracteriza uma igreja é a sua identidade de fé intergeracional.
Nos esquecemos facilmente que os dois grupos mais antagônicos do primeiro século, judeus e gentios foram unidos numa única comunidade, algo impensável na época, somente porque a cruz de Cristo fincada no chão de nosso mundo iniciou o processo de transformação de todas as coisas. Ou a cruz de Cristo aboliu qualquer muro de separação (inclusive o da idade) ou não derrubou muro nenhum (Ef. 2.11-18). Como já foi dito, não precisamos do evangelho, muito menos do poder de Deus para unir pessoas por afinidade, pois isso pode ser encontrado em qualquer lugar fora da igreja. Em uma época cheia de poderes que buscam nos segregar de todas as formas, a união de gerações que não têm afinidade alguma é uma demonstração poderosa de que Jesus é Senhor e que o reino de Deus foi inaugurado na terra como no céu.
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