Categoria

terça-feira, 21 de agosto de 2018

THANOS E SUA VISÃO DE MUNDO PAGÃ

O que falar de um filme como Vingadores, Guerra Infinita? Não me vem outra resposta senão THANOS. Que vilão tão bem construído! Nada daquelas caricaturas ultrapassadas, tais como risada estrondosa, voz grave ou rouca demais como Mumm Ra de Thundercats, ou discursos de destruição total do mundo semelhante ao encontrado em X-Men, Apocalipse. Não é atoa que “uma boa história é boa quando o vilão é bom, pois um inimigo poderoso força o herói a crescer para enfrentar o desafio” (Voegler). 

O titã louco foi magistralmente humanizado, seja pela serenidade de sua voz, ou mesmo expressões faciais. Thanos é bastante pragmático em sua visão de mundo. Sua “nobre” intenção é manter o equilíbrio do universo, dessa forma ele deseja realizar um controle demográfico em escala cósmica com o genocídio da metade da população de todo o universo, isso fará com que a balança dos recursos naturais se estabilize com seu consumo. O fim da fome só virá com o fim dos famintos, e ele está irredutivelmente certo de sua missão. “Um tipo perigoso de vilão é “o homem determinado”, a pessoa tão convencida de que sua causa é justa que nada o impedirá de alcançá-la” (Voegler). 

É nesse cenário que encontramos duas visões de mundo que se colidem. Se Thanos está disposto a arriscar tudo para dizimar metade da vida do universo, os Vingadores se arriscam para salvar uma única pessoa. “Não negociamos vidas!”, disse Steve Rogers. Descartar metade da vida do universo para que a outra sobreviva, como quer Thanos, é uma visão de mundo pagã. Já a defesa da vida, mesmo sob o risco de morte defendida pelo Capitão América é essencialmente cristã. Enquanto todos buscavam se salvar das epidemias que assolavam os dois primeiros séculos da era cristã, os seguidores de Jesus decidiram ficar para cuidar dos doentes, mesmo sob o risco de morte. Se era comum o alto número de infanticídio de meninas no mundo greco-romano, foram os cristãos que levantaram suas vozes em protesto. O respeito a dignidade do outro, não importando sua classe social ou etnia, mesmo que defendido em um mundo secular como o nosso, não é outra coisa senão um valor cristão. 

Thanos deseja promover uma roleta russa para inibir o aumento do controle populacional. Com um simples estalar de dedos, o gatilho da aleatoriedade seria acionado para dizimar metade da vida do universo, sem saber, todavia, quem seria o sorteado. Essa é a sua justiça, não escolher quem deverá morrer. Claro que o titã não estará entre os “felizardos” com a possibilidade de ser escolhido. Como muitos ditadores ao longo do tempo, Thanos, sob a justificativa do bem comum, está disposto a promover o sacrifício de muitos. 

"Não é justo. Não devia ser você, mas é. Não tem problema. Você nunca poderia me machucar”. Nesse diálogo entre Visão e Feiticeira Escarlate – que para alguns soou meio piegas – ao menos para mim foi muito revelador. Uma coisa seria o Visão ser morto por alguém que lhe fosse indiferente, já ser morto pela pessoa que nunca lhe faria mal, é muito assustador. É aqui mais uma vez que vemos a visão de mundo cristã superando a cosmovisão pagã. A autodoação, o coração da mensagem do evangelho, que Deus Pai abriu mão de seu único Filho, e este abriu mão de toda sua glória para morrer numa cruz. Claro que Deus Pai nunca faria mal algum ao seu Filho, mas cabia a Ele a árdua tarefa de ferir seu Filho na cruz em benefício daqueles que na cruz deveriam morrer. 

Para Thanos alcançar seu objetivo bastava fechar o punho e estalar os dedos. Deus em Cristo, por sua vez, fez o que fez não fechando seu punho nem estalando os dedos, mas abrindo suas mãos ao conceder perdão e ajuda aos mais fracos e ao abrir seus braços na cruz, não em demonstração de fraqueza, mas do poder do amor divino que destrói qualquer manopla do infinito.

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

ABORTO

INTRODUÇÃO 

O partido PSOL protocolou uma ação no Supremo Tribunal Federal pedindo a descriminalização do aborto até o terceiro mês de gestação. Segundo o próprio partido, aproximadamente 500 mil mulheres fizeram aborto no Brasil em 2015. 

Não podemos negar a complexidade do assunto. Envolve questões médicas, legais, teológicas, sociais e pessoais. Contudo, a sua complexidade não pode nos levar para a margem da discussão. Enquanto igreja temos o dever de ser luz do mundo. Levar a mensagem do evangelho mesmo em assuntos onde muitos querem que guardemos nossa opinião para nós mesmos. Como se nossa convicção cristã servisse somente para questões de foro íntimo. Precisamos lembrar sempre que nosso Deus é um Deus de questões públicas. Deus não está preocupado somente com minha vida de oração e leitura da Bíblia. Não podemos manter uma postura religiosa a favor da vida e nos esquecer disso ao votar em candidatos que são a favor do aborto. 

DESENVOLVIMENTO 

O grande médico da antiguidade, Hipócrates (sec. V a.C) fez o seguinte juramento: “Aplicar os tratamentos para ajudar os doentes conforme minha habilidade e minha capacidade, e jamais usá-los para causar dano ou malefício. Não dar veneno a ninguém, embora solicitado a assim fazer, nem aconselhar tal procedimento. Da mesma forma não aplicar substância abortiva em mulher alguma”. A Declaração de Genebra de 1948 atualizou o juramento com a seguinte cláusula: “Manterei o mais alto respeito pela vida humana, desde a sua concepção”. 

Depois das mazelas provocadas pelo nazismo na Alemanha, o Código de Nüremberg, um documento “que destacou que não se deve fazer mal aos seres humanos por meio da pesquisa e de qualquer procedimento médico.” (EULER R. WESTPHAL. 2009). 

O aborto envolve duas doutrinas de acordo com a Bíblia: Deus e a humanidade. Deus como o doador da vida e soberano sobre ela, e a dignidade da vida humana como imagem de Deus. Somente por meio de uma confissão de fé podemos afirmar a dignidade da vida humana. Nós não temos o poder de conferir dignidade à vida humana, simplesmente a reconhecemos como algo dado por Deus. 

Nos EUA desde 1973 quando a Corte Suprema legalizou o aborto, foram realizados 58 milhões de abortos. Menos de 1% era referente a estupro e incesto. A grande maioria era por mera conveniência. Foi descoberto nos EUA o que se chama de aborto pós-parto. Acontece quando o feto nasce por conta dos procedimentos iniciais, e logo em seguida é abortado. Isso é uma ofensa gritante ao Criador. 

Na Inglaterra e no País de Gales até a instituição da reforma da lei do aborto, o número de abortos praticados estava na casa de 6.100 até 1966. Em 68 já estava em 24 mil. Em 73, 167 mil. Em 83, mais de 184 mil. Em 2000, 185.376 abortos. Até 2002, mais de 5 milhões de abortos foram praticados. 98% foram realizados por razões sociais. Foi estimado que em 1968 em todo o mundo o número de abortos era algo em torno de 30 e 35 milhões. Hoje pratica-se 55 milhões de abortos em todo o mundo a cada ano. Isso dá mais de um aborto por segundo. (JOHN STOTT. 2014). 

Essa tolerância em se tratando do número de abortos praticado em todo o mundo, mostra o quanto estamos nos degradando socialmente. Esse foi o caso da Roma antiga. Era comum jogar os filhos indesejados em lixões ou abandoná-los ao relento. Não havia punição para isso. Em Esparta, filhos com alguma deficiência aparente eram simplesmente atirados dos penhascos. John Stott nos alerta para o problema dos eufemismos no caso de abortos. O feto não é um simples material genético, mas uma criança que ainda não nasceu. Aborto, não é a interrupção de uma gravidez, mas da vida de uma criança. Não é sem motivos que já foi dito que nosso mundo pós-moderno é também pós-humano (EULER R. WESTPHAL. 2006). 

O que pensamos sobre o feto vai determinar nossa posição em relação ao aborto. Se o feto é um objeto inanimado, um amontoado de células, ao menos até a décima segunda semana de gestação, como querem os que são pró-aborto, então não há nada demais em interromper seu desenvolvimento. No entanto, já na sexta ou sétima semana de vida, o feto possui função cerebral, e na oitava semana ele já tem todos os membros formados, dedos e digitais. (JOHN STOTT. 2014). Estão querendo tirar a dignidade do feto, torná-lo descartável. Isso para defender o direito das mulheres. O século 20 viu que o nazismo surgiu como a maior e mais eficiente máquina de matar, e isso com o ideal de promover um bem maior (EULER R. WESTPHAL. 2009). 

Mas se entendemos que desde a concepção o feto é dotado de vida humana, mesmo que em desenvolvimento, então a sua interrupção é uma afronta ao Deus que é o criador da vida. Apontar a deficiência do feto como prerrogativa para o aborto não o torna menos ofensivo a Deus. Uma criança com deficiência não é menos criação de Deus que outra que não possui nenhuma deficiência (Ex. 4.11). Por que interromper uma vida que já nasceu com deficiência é errado, mas interromper uma vida com deficiência que ainda não nasceu seria correto? Estamos falando de vida humana. Se o feto equivale a uma criança, o aborto equivale a infanticídio. Timothy Keller diz que na abolição da escravidão não foi dado o direito de escolha se as pessoas queriam ou não ter escravos. A escravidão foi vista como incompatível diante da dignidade do ser humano. O mesmo deveria acontecer com o aborto. 

Em O Senhor dos Anéis, o mago Gandalf disse: “Muitos que vivem merecem a morte. E alguns que morrem merece viver. Você pode dar-lhes a vida? Então não seja tão ávido para julgar e condenar alguém a morte. Pois mesmos os muitos sábios não conseguem ver os dois lados”. Sobre isso, existe a seguinte história de um médico que pergunta ao outro: “Eu gostaria de saber a sua opinião em relação à interrupção de uma gravidez na seguinte situação: o pai tem sífilis e a mãe, tuberculose. Dos quatro filhos deles, o primeiro era cego, o segundo morreu, o terceiro era surdo e mudo e o quarto também tinha tuberculose. O que você teria feito com essa gravidez?”. “Eu a teria interrompido” – respondeu o outro. “Então você teria matado Beethoven”

VISÃO BÍBLICA DO FETO 

O salmo 139 serve como uma boa reflexão da dignidade humana do feto. O texto faz uso de linguagem metafórica, do oleiro e tecelão (Jó 10.8). Exalta o trabalho de habilidade criativa de Deus. O salmista já adulto olha para todos os estágios de sua vida e se entende como sendo a mesma pessoa. Note que ele sempre faz uso dos pronomes eu, me. Ele possui a mesma identidade pessoal, seja no estagio pré-natal ou pós-natal. Ele chega a dizer que antes mesmo de ter algum relacionamento consciente com Deus, Deus já tinha com ele. O que nos torna uma pessoa neste caso é o fato que Deus nos conhece (Jó. 31.15; Sl. 22.9,10; 71.6; 119.73), (STOTT. 2014). O mesmo pode ser dito de Jesus. Ele foi o mesmo na concepção, no nascimento, na morte e em sua ressurreição (Mt. 1.21). Nota-se pelo texto que o Jesus que salvará seu povo quando estiver adulto é o mesmo que se encontra no ventre de Maria. 

REFERÊNCIAS 

WESTPHAL, EULER R. Para Entender Bioética. São Leopoldo/RS. Sinodal. 2006. 

____________________ Ciência e Bioética. São Leopoldo/RS. Sinodal. 2009. 

STOTT, JOHN. Os Cristãos e os Desafios Contemporâneos. Viçosa/MG. 2014.